Nascimento de Anita Garibaldi

Junto à causa rebelde, a revolucionária participou da Revolução Farroupilha e do processo de Unificação Italiana

Por
Alice Elias
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Nascimento de Anita Garibaldi
Segundo Leonardo dos Reis Gandia, "Anita Garibaldi deixou sua cidade natal e incorporou-se à armada farroupilha, liderada por Garibaldi, sob o comando de quem lutou algumas batalhas navais em favor da causa rebelde".  (Arte: Alice Elias)

Anita Garibaldi nasceu no dia 30 de agosto de 1821, em Santa Catarina. Conhecida principalmente por sua participação na Revolução Farroupilha (1835-1845), Anita se uniu ao líder revolucionário Giuseppe Garibaldi e lutou em batalhas junto à causa rebelde. Além de contribuições nacionais, a revolucionária participou do processo de Unificação Italiana, com seu marido Giuseppe.

Conversamos com Leonardo dos Reis Gandia, mestre em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, sobre essa figura histórica “eternizada no imaginário popular” e sobre o contexto da Revolução Farroupilha. Confira:

Serviço de Comunicação Social: Você poderia comentar brevemente sobre quem foi Anita Garibaldi?

Leonardo dos Reis Gandia: Eternizada no imaginário popular, na literatura, e nas narrativas encomiásticas da Guerra dos Farrapos como Anita Garibaldi, Anita Maria de Jesus Ribeiro nasceu em Laguna, na ainda capitania de Santa Catarina, em 30 de agosto de 1821. Terceira filha de uma família pobre da cidade, Anita Ribeiro casou-se muito jovem, em seu aniversário de 14 anos, com o sapateiro Manuel Duarte de Aguiar, com o propósito de auxiliar no sustento da família, após a morte de seu pai. Seu casamento duraria poucos anos, uma vez que, no contexto da chamada Revolução Farroupilha, seu esposo, imbuído de ideias monarquistas, passou a integrar as colunas militares imperiais contra os rebeldes rio-grandenses.

Nesse mesmo contexto da Guerra dos Farrapos, Anita Ribeiro ficaria conhecida como Anita Garibaldi, após sua união com o líder revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi, refugiado no Rio Grande do Sul após sua condenação à pena capital no reino da Sardenha. A partir de 1839, portanto, Anita Garibaldi deixou sua cidade natal e incorporou-se à armada farroupilha, liderada por Garibaldi, sob o comando de quem lutou algumas batalhas navais em favor da causa rebelde, foi feita prisioneira e, após empreender fuga, logrou refugiar-se com Garibaldi em Montevidéu, em meio às contendas da Guerra Grande (1839-1851). Após cerca de 7 anos em solo uruguaio, o casal rumou para a Europa, onde também participaram dos combates no processo de Unificação Italiana e onde morreu, grávida de seu quinto filho com Garibaldi, aos 27 anos.

Serviço de Comunicação Social: Anita teve uma importante participação na Revolução Farroupilha. Qual o contexto da Revolução, e quais as repercussões desse movimento?

Leonardo dos Reis Gandia: A Guerra dos Farrapos, também conhecida por Revolução Farroupilha, foi a rebelião provincial mais longeva da história do Brasil Império. Iniciada em 20 de setembro de 1835, sob a liderança do rico estancieiro Bento Gonçalves da Silva, a rebelião se estendeu até 1º de março de 1845, após a assinatura da “Paz de Ponche Verde”, que pacificou a província mais austral do Império e a reintegrou ao território nacional.

Rebelião eminentemente de elite, a Farroupilha teve início em decorrência da insatisfação dos estancieiros e charqueadores rio-grandenses contra a política do então presidente da província (nomeado pelo governo central) Antonio Rodrigues Fernandes Braga. Os rebeldes exigiam a destituição do titular e a nomeação de outro presidente, indicado pela elite provincial e, portanto, mais afeito aos interesses dos poderosos locais.

Mesmo alcançando as reivindicações iniciais, parte da elite rio-grandense não se satisfez com os resultados e, escalando as cizânias internas e entre o centro e a província, levaram a situação ao separatismo, concretizado em setembro de 1836, quando parte da elite farroupilha proclamou a República Rio-grandense (também conhecida como República de Piratini).

Ao longo de quase uma década de conflitos, os farrapos não chegaram a ocupar toda a província do Rio Grande do Sul, embora tenham tido êxito (ainda que de curta duração) na conquista de Laguna, no litoral de Santa Catarina, onde proclamaram a efêmera República Catarinense Livre e Independente, mais conhecida como República Juliana (24/07/1839-15/11/1839). Foi nesse momento da rebelião que Anita Ribeiro e Giuseppe Garibaldi se conheceram.

Diante do prolongamento do conflito, das cisões internas na elite farroupilha e proximidade com o contexto belicoso da Guerra Grande no Uruguai (que envolvia também exércitos de várias províncias argentinas), o governo imperial seguiu a via da negociação, enviando Luis Alves de Lima e Silva, então barão (e futuro duque) de Caxias para pacificar a província. Após alguns anos de combates com os rebeldes, aproximações com setores estratégicos da elite provincial e negociações bem-sucedidas com os farrapos, o Império, por meio de Caxias, reintegrou a província ao território brasileiro, com a assinatura da Paz de Ponche Verde. Ao contrário de inúmeras rebeliões provinciais que marcaram aquele período, combatidas com força e violência pelo governo, a Guerra dos Farrapos chegou ao seu termo muito mais pela via da negociação e com generosas concessões feitas pelo Império à elite rebelde.


Leonardo dos Reis Gandia é bacharel e licenciado em História pela FFLCH USP, e mestre em História Social pela mesma instituição. Atualmente, desenvolve pesquisa de doutorado na área de História do Brasil Império, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História Social da FFLCH USP.

Para quem se interessar sobre o processo de pacificação da Farroupilha e seus resultados posteriores, Leonardo é autor do livro A política ao fio da espada: Caxias e a consolidação dos interesses brasileiros no Rio da Prata, São Paulo: Intermeios/FAPESP, 2019.