Exportação da literatura brasileira teve um boom no início do século 21

Pesquisadora da FFLCH estudou a recepção internacional de obras brasileiras vencedoras do Prêmio Oceanos

Por
Gabriela Ferrari Toquetti
Data de Publicação

Biblioteca Mário de Andrade. Imagem: Marcos Santos/USP Imagens

O ano de 2003 marcou a primeira edição do Prêmio Oceanos de Literatura, considerado atualmente um dos prêmios mais importantes nos países de língua portuguesa. No mesmo ano, Lula iniciava seu primeiro mandato como Presidente do Brasil. Como essas duas informações se relacionam no contexto da literatura brasileira?

Lohanna Machado. Imagem: Currículo Lattes

Esse foi o objeto de estudo do doutorado de Lohanna Machado, especialista em literatura brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. A pesquisadora observou que, a partir de 2003, o Brasil viveu um boom de investimentos na venda da cultura brasileira para exportação. Para estudar a internacionalização da literatura brasileira, Lohanna concentrou sua pesquisa em obras vencedoras do Prêmio Oceanos - mais especificamente, em obras traduzidas na França, no Reino Unido e nos Estados Unidos.

Ela relata que, entre 2003 e 2021, os autores do Brasil foram 47 dos 62 premiados pelo Oceanos e que houve um aumento significativo nas traduções de romances brasileiros no período analisado. Daí, surge a dúvida: qual é o lugar da literatura brasileira na cultura mundial?

O conceito de soft power

O aumento no interesse mundial pela literatura brasileira no início do primeiro governo de Lula está relacionado ao conceito de soft power. A pesquisadora explica que esse termo descreve os governos que buscam se promover no cenário internacional de uma forma branda, por meio da atração - por exemplo, por meio da literatura - e não a partir de recursos financeiros ou bélicos. O Brasil investiu muito em soft power naquele período e os resultados foram positivos.

Prestígio e crítica literária

A pesquisa revelou que os efeitos desses investimentos não foram observados apenas em números. Lohanna analisou também as avaliações das obras brasileiras traduzidas em meios de publicação de crítica literária de outros países e o grau de prestígio desses meios. Os resultados dessa análise foram favoráveis e impressionaram a pesquisadora: “essa literatura não foi traduzida somente por causa dos incentivos governamentais, mas também porque muitas dessas obras foram lidas pelos principais jornais, elogiadas e comparadas aos grandes nomes da literatura universal”.

Total de críticas, entrevistas, participação em listas e menções recebidas por cada publicação de romances brasileiros. Imagem: Lohanna Machado/Tese de Doutorado

A queda e uma nova esperança

Os investimentos intensos em exportação da cultura brasileira duraram até o início do segundo mandato de Dilma Rousseff, em 2015, quando cortes começaram a acontecer em um período conturbado da política brasileira. Em 2016, após o impeachment, os cortes foram mais severos. De acordo com Lohanna, os governos Michel Temer e Jair Bolsonaro não tinham a cultura como prioridade. Nesse momento, começou o fim do boom de internacionalização da literatura do Brasil. A pesquisa verificou que, depois de 2016, o número de traduções de obras brasileiras começou a diminuir.

Mas “as coisas não mudam do dia para a noite”, segundo Lohanna: muitos dos frutos colhidos na época do boom não desapareceram e a cultura brasileira ganhou um maior prestígio no exterior. Hoje, a pesquisadora afirma que existe uma onda de esperança na esfera cultural, graças ao contexto político atual. Com aporte do governo, a literatura brasileira pode voltar a crescer cada vez mais.