"Pele negra, máscaras brancas" é publicado

Uma obra fundamental para a análise e o enfrentamento do problema racial nos dias atuais

Por
Larissa Gomes
Data de Publicação

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Em Pele negra, máscaras brancas, Fanon nos mostra o racismo como elemento fundamental de dominação colonial, segundo Gabriel dos Santos Rocha.

Em 1952, Franz Fanon publicava seu livro Pele negra, máscaras brancas. A obra foi fundamental para expor o racismo na dominação colonial. Segundo Gabriel dos Santos Rocha, doutorando em História Econômica pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, o livro é uma obra essencial para o enfrentamento dos problemas raciais nos dias atuais, além disso, dialoga com diversos campos científicos como: psicologia social, sociologia, filosofia, linguística, teoria literária, etc. 
No sentido político, a obra é uma referência para movimentos negros e fundamental na produção de conhecimentos que podem embasar prática antirracista. Além disso, podemos encontrar também uma relação com o pensamento do autor em obras de outros pensadores brasileiros, como Beatriz Nascimento, Lélia Gonzalez, Sueli Carneiro, Clóvis Moura, Abdias Nascimento, Guerreiro Ramos, Octavio Ianni, etc.


Para conhecer mais sobre a obra, confira a entrevista completa com Gabriel dos Santos Rocha:

Serviço de Comunicação Social: Poderia dizer qual é a temática central abordada pela obra?
Gabriel dos Santos Rocha: Em Pele negra, máscaras brancas, Fanon nos mostra o racismo como elemento fundamental de dominação colonial, e analisa seus efeitos objetivos e subjetivos entre negros e brancos. Se podemos dizer que o colonialismo é um sistema de dominação política e exploração econômica de um Estado exterior a um povo, o racismo é um mecanismo extra econômico que viabiliza tal dominação e exploração, trata-se de uma ideologia que inferioriza ou desumaniza o colonizado na relação com o colonizador e reproduz um mundo cindido por um conjunto de formas de dominação e opressão.


Serviço de Comunicação Social: Em sua análise, qual a importância de Pele negra, máscaras brancas para os dias atuais? Porque a obra deve ser lida atualmente?
Gabriel dos Santos Rocha: Trata-se de uma obra fundamental para a análise e o enfrentamento do problema racial nos dias atuais, tanto na produção de conhecimento, quanto na práxis política antirracismo. Fanon era um psiquiatra de formação e profissão, no entanto, foi um militante político engajado na luta anticolonial, antirracista e anticapitalista. Sua obra foi concebida no bojo de intensos estudos e ações políticas no processo de descolonização desencadeado no pós-Segunda Guerra Mundial; e seu sentido reside na luta pela superação do racismo e outras formas de opressão (raça, classe, gênero, sexualidade, nacionalidade, etc). No campo das ciências humanas, o livro contribui muito na reflexão sobre o racismo nos campos com o qual o autor dialoga: psicanálise, psicologia social, sociologia, filosofia, linguística, teoria literária, etc. No campo da política, o livro é referência para movimentos sociais negros e de outros setores oprimidos nas mais diversas sociedades do mundo contemporâneo.

Serviço de Comunicação Social: Como foi dada a repercussão da obra no Brasil?
Gabriel dos Santos Rocha: No Brasil, a obra foi recebida um tanto tardiamente, isso nos remete ao silêncio sobre autores e autoras negras como algo sintomático do racismo brasileiro que atinge também nosso mercado editorial. A primeira edição saiu em 1983 pela editora Fator (especializada no campo da psicanálise), em um contexto de ascensão do movimento social negro na luta contra o racismo e contra a ditadura militar (1964-1985). Neste mesmo ano, a psiquiatra e psicanalista Neusa Santos Souza também lançava o seu livro Tornar-se Negro no qual se verificam convergências com o pensamento de Fanon. Do mesmo modo, vemos também um diálogo com o autor em obras de Beatriz Nascimento, Lélia Gonzalez, Sueli Carneiro, Clóvis Moura, Abdias Nascimento, Guerreiro Ramos, Octavio Ianni e outros. É possível que, antes de ser editada oficialmente no Brasil, a obra tenha circulado entre a militância negra em traduções no espanhol, inglês, ou mesmo em edições em francês. Uma segunda edição saiu em 2008 pela editora da UFBA e em 2020 outra pela Ubu.
Nota-se também que o crescente interesse por Fanon no Brasil coincide com o aumento de estudantes e pesquisadores negras e negros nas universidades, isso se reflete nos temas de pesquisa nos departamentos, nas citações e referências bibliográficas em dissertações, teses, artigos, etc. Hoje, temos trabalhos de altíssima qualidade sobre Fanon como os de Deivison Faustino, além de uma nova geração de autores que têm o psiquiatra martinicano como referência.

Gabriel dos Santos Rocha é Doutorando em História Econômica, Mestre em História Social e graduado em História pela FFLCH - USP.