Importante autor de literatura fantástica, escritor e filósofo britânico, C. S. Lewis escreveu As Crônicas de Nárnia, saga que encantou o mundo
Escritor e filósofo britânico do século 20, Clive Staples Lewis nasceu no dia 29 de novembro de 1898, em Belfast, Irlanda do Norte. Famoso por sua obra As Crônicas de Nárnia e autor de diversos livros de romance, ensaios sobre o cristianismo e escritas fantásticas, Lewis começou sua trajetória na literatura ainda na adolescência, quando se interessou por mitologia, ocultismo e literatura nórdica.
Crescido em uma região de Belfast fortemente protestante, o autor viveu em um lar tradicional. Seu pai era um advogado local e sua mãe era professora de matemática. Ainda na adolescência, aos 15 anos, Lewis se tornou ateu.
Mais tarde, quando conseguiu uma bolsa de estudos, ingressou na University College Oxford, mas o início de sua jornada acadêmica foi interrompida pela Primeira Guerra Mundial, quando teve que prestar serviços militares. Ao retornar aos estudos, C. S. Lewis e seu irmão, Warren Lewis, se mudaram para a famosa The Kilns, conhecida como a “Casa de C. S. Lewis”, onde o autor passou toda a sua vida e escreveu suas obras, incluindo todos os volumes de As Crônicas de Nárnia.
Durante seus estudos em Oxford, fundou o The Inklings, grupo informal que marcou o cenário literário mundial. Os Inklings era formado por autores conhecidos como J. R. R. Tolkien, Charles Williams e Owen Barfield. Reuniões eram feitas para discutir as obras que estavam sendo produzidas por eles, os primeiros manuscritos de Senhor dos Anéis, por exemplo, foram lidos pela primeira vez nessas reuniões. O grupo não tinha regras e nem teor formal, o objetivo deles era apenas enaltecer o valor de produções fictícias e se divertirem.
A amizade com Tolkien, Dorothy Sayers e outros autores cristãos influenciou o retorno das crenças de Lewis no cristianismo. Daí surgiram suas obras de reflexão cristã que o tornou admirado na comunidade cristã contemporânea. O autor escreveu 38 livros, dentre eles, Cristianismo Puro e Simples, o mais famoso depois de As Crônicas de Nárnia.
Para Cristiano Camilo Lopes, doutor e mestre pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, C. S. Lewis “convida o leitor à reflexão a respeito do lugar da ética tradicional” em suas obras.
Confira a entrevista com Cristiano Camilo Lopes para o Serviço de Comunicação Social da FFLCH:
Serviço de Comunicação Social da FFLCH: Poderia dizer quem foi C.S Lewis e contar um pouco de sua trajetória?
Cristiano Camilo Lopes: C. S. Lewis é um autor bastante conhecido pelo público infantil e juvenil (e adultos também) por causa da sua obra As Crônicas de Nárnia, mas Lewis também escreveu outras obras com grande circulação entre leitores. São obras que envolvem a ficção com temática cósmica (Aquela fortaleza medonha, Perelandra e Além do planeta silencioso), escrita mitopoética e pensamento cristão (Cristianismo puro e simples, O problema da dor, surpreendido pela alegria, Deus no banco dos réus, O peso da glória, Os quatro amores, entre outras) e crítica literária.
Lewis viveu no século XX (1898-1963) e, além de escritor, também foi professor e crítico literário nas Universidades de Oxford e Cambridge, onde desenvolveu sua carreira docente.
Pode-se afirmar que ele possuía três tônicas em sua atuação e produção: (1) erudição, tendo em vista seu lastro como crítico literário e teórico da literatura; (2) postura reflexiva sobre pensamento cristão e filosófico, uma vez que escreve várias obras que são fruto de suas reflexões sobre Cristianismo, naturalismo, conhecimento moral, amor, poder, violência e sofrimento; (3) produção de obras literárias, por meio das quais se tornou bastante conhecido.
Serviço de Comunicação Social da FFLCH: Crônicas de Nárnia é a obra mais famosa do autor, por que é importante e o que ela representa para a sociedade?
Cristiano Camilo Lopes: As Crônicas de Nárnia é uma obra que apresenta ao leitor o mundo literário imaginário de Nárnia (lugar onde os animais falam, onde se abrem portais de acesso entre o mundo real e o ficcional e onde se apresentam elementos alegóricos). Trata-se de um espaço narrativo em que o leitor tem a opção de refletir a respeito dos aspectos do mundo real por meio de um outro olhar: o da ficção.
A leitura das Crônicas conduz o leitor na reflexão a respeito de temas que permeiam Nárnia e que também são pertinentes ao ser humano desde sempre (o lugar da virtude na formação do homem, o mal, a ecologia, a amizade, a beleza, a morte etc).
Vale destacar também que, com a adaptação fílmica das Crônicas a partir de 2005, o número de leitores da obra aumentou significativamente, inclusive no Brasil.
Serviço de Comunicação Social da FFLCH: De que forma as ideias de Lewis sobre a moralidade e a ética se refletem em suas obras?
Cristiano Camilo Lopes: Tanto nas obras ficcionais (especialmente nas Crônicas de Nárnia) como nas demais produções, Lewis convida o leitor à reflexão a respeito do lugar da ética tradicional. Conforme afirmou Colin Duriez, em Nárnia, por exemplo, percebemos que bondade e verdade são leves, mal e maldade são sombras, a morte é amarga e a resistência é louvável, tudo isso em uma atmosfera em que virtude e beleza são convergentes.
A reflexão advinda da leitura das obras de Lewis chama ao diálogo a respeito da possível troca da moralidade tradicional por “um tipo de moral que envolve uma aceitação acrítica e dogmática do sistema de valores encontrado entre os jovens educados por pessoas no período entre as guerras (do século XX)”, conforme nos informou Manfred Svensson. Nessa troca, um conjunto de preceitos compartilhados pelas grandes culturas e religiões da humanidade (como Beowulf, Analectos de Confúcio, Novo Testamento), foram postos de lado por conta de uma veiculação religiosa desses textos ou ainda por serem considerados “uma manifestação de interesses subjetivos ou mero reflexo de um estado emocional, e agora busca encontrar [...] fora do que foi recebido, a base para uma nova moralidade.” (Manfred Svensson).
Nesse sentido, por meio da leitura das obras de Lewis, o leitor é convidado a um diálogo a respeito do lugar da moralidade nas relações humanas e também na sua relação com o sentido da vida.
Serviço de Comunicação Social da FFLCH: Qual a relevância das ideias de Lewis para a sociedade contemporânea?
Cristiano Camilo Lopes: Acredito que as ideias de Lewis não são autoridade final para os assuntos abordados, mas podem funcionar como índices que mostram as referências que Lewis buscou em outras épocas e lugares para responder a questões da vida.
Também é importante considerar as ideias de Lewis a respeito do projeto da modernidade. Nesse aspecto, ele trouxe para a avaliação do século XX a questão: “as mudanças são sempre melhores?” Com o projeto da modernidade, Lewis entende a presença de mudanças positivas em várias áreas, mas ele também discute uma possível ambivalência: “a mesma cultura que nos tornou mais benevolentes para com as crianças tornou-nos mais indiferentes para com os idosos.” Assim, Lewis desafia o olhar do leitor para o passado, não para encontrá-lo, mas para que ele não se veja preso no presente. (Manfred Svensson)
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Cristiano Camilo Lopes é docente na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), e atua como professor-pesquisador na graduação (curso de Teologia e Pedagogia) e na pós-graduação Stricto Sensu (Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura). É doutor e mestre em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. onde realizou sua tese "Da terra das sombras à terra dos sonhos: o espaço sagrado na literatura para crianças e jovens (2009)", que analisou obras de Literatura para Crianças e Jovens, incluindo As Crônicas de Nárnia de C. S. Lewis.