Impeachment de Dilma Rousseff

Ex-presidente foi afastada definitivamente do cargo por crime de responsabilidade fiscal

Por
Pedro Fuini
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Dilma Rousseff
Para André Singer, Dilma levou as características do lulismo ao limite, aproximando-se de um processo de reformismo mais acentuado, o que provocou uma reação do capital, que se unificou contra ela. (Arte: Pedro Fuini)

Por 61 votos a favor e 20 contrários, o Senado afastava definitivamente Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), do cargo de Presidente da República em 31 de agosto de 2016. O Senado, porém, manteve os direitos políticos de Rousseff em votação separada - caso contrário, a ex-presidente perderia o direito de se candidatar a cargos públicos por oito anos. Pela segunda vez em sua história recente, o Brasil viu um Chefe de Estado sofrer um processo de afastamento (impeachment) – o primeiro foi Fernando Collor, em 1992. 

Juristas protocolaram pedido de impeachment no Congresso Nacional, em outubro de 2015, alegando que Dilma cometeu crime de responsabilidade por realizar manobras fiscais conhecidas como "pedaladas”. Em dezembro do mesmo ano, o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB, atual MDB), autorizou o início do processo.

A ex-presidente enfrentava uma crise política iniciada ainda em seu primeiro mandato. Sua relação com o Congresso estava cada vez mais desgastada. Com a piora da economia e o avanço de investigações da Polícia Federal no âmbito da Operação Lava Jato, que atingiam grandes figuras políticas, cresceu um movimento de massas contrário ao seu governo. Ao comentar sobre o caminho até o impeachment, o professor André Singer, do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP afirma que o primeiro governo de Dilma levou ao limite as características do lulismo – política de conciliação de interesses visando transformações sociais sem confrontar o capital –, aproximando-se de um processo de reformismo mais acentuado. “Tal postura provocou uma reação do capital, que se unificou contra ela”. 

O acirramento das eleições de 2014, em que o PT saiu vitorioso por uma margem estreita, de 51,64% contra 48,36% do senador Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), também contribuiu com a crise política. Após sair derrotado pela quarta vez, o PSDB, que polarizou o cenário nacional com o PT até 2014, decidiu colocar em dúvida o resultado das eleições daquele ano. Tudo isso, de acordo com Singer, “somou-se às articulações em favor de um golpe parlamentar”.

Em 17 de abril de 2016, a Câmara dos Deputados aprovou a abertura do processo contra Dilma, por 367 votos favoráveis e 137 contrários; em 12 de maio, foi a vez do Senado aprovar sua continuidade por 55 votos a 22, afastando a presidente do cargo até a conclusão do processo de impeachment. Assume, então, em seu lugar o vice-presidente Michel Temer (PMDB), que Singer cita como um dos articuladores interessados no afastamento de Dilma. Ele seria empossado definitivamente como presidente em 31 de agosto de 2016, com a confirmação da perda do mandato da ex-presidente.

Durante e após o impeachment, houve contestações por parte de políticos e juristas sobre a prática de “pedalada fiscal” configurar ou não crime de responsabilidade, e se era esse o real motivo pelo qual o Congresso queria afastar Dilma. “A Folha de São Paulo, jornal insuspeito de apoiar Dilma, reconheceu em editorial que as ‘pedaladas’ não constituíam crime de responsabilidade”, afirma Singer. “Foram os interesses econômicos e políticos mencionados que provocaram o impeachment”. 

Após a queda de Dilma Rousseff, o governo de Michel Temer representou uma mudança substancial em relação aos governos petistas anteriores (2003-2016). A aprovação de pautas conservadoras, como o teto de gastos, as reformas trabalhista e previdenciária e a autonomia do Banco Central, foram possibilitadas com o impeachment, na análise de André Singer. “Além disso, a radicalização antipetista abriu o caminho para a ascensão da extrema-direita na figura do atual presidente da República, Jair Bolsonaro (atualmente filiado ao Partido Liberal, o PL)”, completa.

André Singer é Professor Titular do Departamento de Ciência Política da FFLCH, onde ingressou em 1990. Possui graduação em Ciências Sociais (1980) pela Faculdade e em Jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP (1986). É mestre (1993), doutor (1998) e livre-docente (2011) em Ciência Política pela FFLCH. Atualmente, é pesquisador do Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania (Cenedic). Tem experiência em Comportamento Eleitoral, Teoria Política Moderna e Classes Sociais na Política Brasileira Contemporânea, atuando nas áreas de comportamento político, problemas da democracia e análise de classe da situação brasileira presente.