Execução da família Romanov

Em 17 de julho de 1918, o czar Nicolau II e sua família foram executados por membros da liderança bolchevique

Por
Alice Elias
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Execução da família Romanov
Segundo o professor Segrillo, "para evitar a possibilidade que algum Romanov fosse solto e recolocado no poder, os bolcheviques apelaram para a execução da família inteira." (Arte: Alice Elias)

Em 17 de julho de 1918, a família imperial russa dos Romanov foi executada por membros da liderança bolchevique. O czar Nicolau II, sua esposa e seus cinco filhos foram baleados na Casa Ipatiev, em Ecaterimburgo, onde estavam em prisão domiciliar após a Revolução Russa de 1917. 

A Revolução Russa é consequência de uma série de acontecimentos que datam desde 1905. Esses episódios, somados às atitudes de Nicolau II durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), revoltaram a população com a inabilidade política e militar do czar. Diante da fragilidade da monarquia russa em um cenário mundial cada vez mais democrático, em fevereiro de 1917 uma sequência de manifestações e atos populares impulsionou a queda de Nicolau II e, consequentemente, o fim do Império. 

Ainda que em prisão domiciliar, a dinastia Romanov representava uma ameaça aos bolcheviques recém chegados ao poder, em outubro de 1917. Perante esse contexto de insegurança, Nicolau II e sua família foram executados em 1918. 

Para mais informações sobre esse evento histórico, conversamos com o professor Angelo Segrillo, Livre Docente de História Contemporânea no Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, e especialista em história da Rússia e ex-URSS eurasiana. 

Serviço de Comunicação Social: Quem foi Nicolau II, e qual foi a sua influência na Rússia no período de 1894 a 1918?

Angelo de Oliveira Segrillo: De certa maneira, Nicolau II foi uma figura trágica. Nem liberal nem repressor demais, tentou seguir um caminho pragmático dentro da monarquia russa tradicional, mas se atrapalhou com as transformações no mundo e na Rússia que já colocavam aquela monarquia como algo obsoleto e ultrapassado dentro das novas condições do mundo de aumento da democracia e do poder dos trabalhadores organizados. Por outro lado, apesar de todas estas circunstâncias, a derrubada da monarquia não era algo predeterminado. Apesar do sistema político ainda repressivo e policial do Império Russo, economicamente a Rússia ia crescendo nos anos que antecederam a Primeira Guerra Mundial. Foi a primeira Guerra Mundial que definitivamente “bagunçou o coreto” do país ao juntar derrotas militares com fome e desorganização produtiva. Aí, a falta de habilidade política e liderança de Nicolau II se fez sentir. Mesmo sem grande experiência militar, resolveu assumir o controle do exército russo, se ausentou da capital, deixando-a livre para que sua esposa e Rasputin desorientassem muitos dos esforços políticos de correção da situação, deixando-a insustentável com o piorar da situação interna com a guerra. O resultado foi a Revolução em 1917 (primeiro a de Fevereiro e depois a de Outubro).

Serviço de Comunicação Social: Quais as possíveis motivações políticas para a execução de Nicolau II e de sua família em 1918? Quais as repercussões e consequências disso?

Angelo de Oliveira Segrillo: A motivação mais imediata da liderança bolchevique para cometer esse regicídio completo foi sua própria insegurança em relação à situação do seu poder no país. Logo após os bolcheviques tomarem o poder, iniciou-se a Guerra Civil de três anos entre Vermelhos e Brancos. Muitos achavam que os bolcheviques não conseguiriam se sustentar no poder, pois tinham mais força apenas nas grandes cidades, enquanto que o campo e o interior do país estavam abertos às forças contrarrevolucionárias. A possibilidade de haver um contragolpe que tentasse colocar a monarquia no poder novamente era alta. Para evitar a possibilidade que algum Romanov fosse solto e recolocado no poder, os bolcheviques apelaram para a execução da família inteira. As consequências foram um acirramento ainda maior da ferocidade da luta entre defensores e detratores dos bolcheviques e uma radicalização desse processo.
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A tese de doutorado do professor Segrillo foi considerada pioneira na historiografia brasileira por ter sido a primeira tese acadêmica nacional sobre a história da Rússia/URSS baseada em pesquisa direta nos antigos arquivos classificados soviéticos e fontes primárias russas originais. Para quem se interessar sobre o tema, o professor é autor de diversos livros e artigos sobre a história da Rússia, entre os quais: O Declínio da URSS: um estudo das causas (ed. Record), De Gorbachev a Putin (ed. Prismas), Rússia: Europa ou Ásia (ed. Prismas), Rússia e Brasil em Transformação (ed. 7letras) e Os Russos (ed. Contexto).