Professora Lilia Schwarcz ministra Aula Magna sobre os processos de racialização no Brasil

Por
Paulo Andrade
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Aula Magna FFLCH 2023 (Fotos: Nilda Pais)

No último dia 27 de março, foi realizada a Aula Magna FFLCH 2023, como parte da programação da semana de recepção aos calouros da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. A professora Lilia Moritz Schwarcz, do Departamento de Antropologia, ministrou a aula "Sobre lembranças e esquecimentos: uma leitura dos processos de racialização no Brasil", Auditório Nicolau Sevcenko. 

Estiveram presentes a professora Ana Paula Torres Megiani, vice-diretora da FFLCH, e o professor Paulo Martins, diretor da FFLCH, que ressaltou como as aulas magnas colocam em relevo todos seus grandes professores para que os novos alunos sintam a Faculdade em toda sua grandeza. Ele também enalteceu a professora Schwarcz e seu trabalho, que orgulha e representa muito bem a FFLCH.

Uma das maiores referências nacionais na área de antropologia e história das populações afro-brasileiras, Schwarcz relembrou seu início como docente no conturbado ano de 1988, ano que, segundo ela, marcou uma batalha de narrativas sobre os sentidos históricos da data da abolição da escravidão no Brasil. 

À época, o debate girava em torno da questão se os 100 anos da abolição eram uma celebração ou uma mentira. Ela acredita que a data representa uma luta em torno do direito à liberdade. “O Brasil recebeu metade dos africanos sequestrados de seus continentes e foi o último a abolir a escravidão”.

A professora comentou como escritor pernambucano Joaquim Nabuco, ainda no século 19, citava as consequências dessa profunda relação do Brasil com a escravidão: "A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil". 

O tempo

Como professora de etno-história, área que circula entre a antropologia e a história, Schwarcz contou que tem pensado muito no tempo, e em como ele é reincidente e se repete. “O tempo é rápido na experiência e longo na memória”. 

O tema de sua aula foi sobre temporalidade e tempo e sobre a marcação ocidental do tempo. Especificamente a temporalidade das imagens naturalizadas do racismo, que ela explicou ser um projeto branco e da modernidade ocidental.

Nesse contexto, a professora se referiu ao processo de racialização da sociedade brasileira que envolve negros e brancos. Uma temporalidade nada evolutiva, que coloca o racismo como parte de nossa rotina, tornando-o supostamente invisível.

Ela destacou os séculos como marcações temporais de grande impacto na nossa imaginação. Eles organizam as experiências em um encadeamento lógico de fatos dificilmente observados empiricamente. Ela explicou como os séculos são representados na história do Brasil pelos arquivos coloniais, que carregam mais silêncios do que memórias.

Na visão de Schwarcz, um arquivo se comporta como um campo vivo, com significados, ambiguidades e indagações. Além de esconder seus critérios de classificação coloniais, eurocêntricos, masculinos e brancos. Eles também iluminam somente as elites e escondem os processos sociais e as lideranças da sociedade civil.

Pensar nos arquivos implica iluminar as tecnologias de governança dessas instituições e desafiar os arquivos como um local de conhecimento imparcial, além de iluminar as lacunas visuais e escritas deixadas por esses documentos.

A professora também convidou todos a refletirem sobre três tempos: o tempo pandêmico, o tempo fotográfico e o tempo do racismo. Ela exemplificou como o Ocidente produziu representações visuais do Oriente, que viram conceitos e verdades na nossa imaginação.

Schwarcz concluiu com uma reflexão sobre o tempo anacrônico: "O tempo anacrônico das imagens, que não apenas ilustram, mas produzem verdades, realidades, contextos, valores. E produzem apagamentos também. Esse tempo anacrônico achata tudo e não nos permite ver. A temporalidade anacrônica é a questão central da modernidade”.

A aula completa pode ser assistida abaixo: