Romance 1984 tornou-se clássico ao apresentar um mundo totalitário dominado pela vigilância tecnológica
No dia 8 de junho de 1949, foi publicado o romance 1984, de George Orwell. O último livro do autor inglês, nascido na Índia Britânica, tornou-se um clássico da literatura mundial e é conhecido por seu suposto caráter profético, ao apresentar um mundo totalitário dominado pela vigilância tecnológica, para criticar o panorama da Guerra Fria. Na narrativa, Orwell consagrou a figura do Big Brother, que representa o controle onipresente por meio de dispositivos eletrônicos.
A doutoranda Débora Reis Tavares, do programa de Estudos Linguísticos e Literários em Inglês da FFLCH, adverte, porém, que “essa interpretação de que Orwell ‘adivinhou’ o que seria do mundo após os anos 1960 não passa de uma leitura rasa, e que deixa passar um dos aspectos mais importantes deste romance, a crítica política em forma de obra de arte”.
A pesquisadora ressalta a preocupação do autor em produzir uma literatura que fosse crítica e, ao mesmo tempo, elaborada esteticamente, durante o contexto da ascensão do fascismo, da Guerra Civil Espanhola, da ascensão e queda do Nazismo e do fim da Segunda Guerra Mundial.
Para ela, “o que nos impressiona muito no primeiro contato com a rotina de Winston Smith e a vida na Londres longínqua e distópica tem muito a ver com a organização da nossa própria sociedade. Apesar de parecer muito diferente – e na época lido como um paralelo claro com Stálin e a União Soviética – o mundo opressor de Winston se organiza em torno do mesmo sistema em que viveu Orwell, Marx, Machado de Assis, a Rainha da Inglaterra, eu e você: o capitalismo”.
O livro, 69 anos após a publicação, mantém-se repleto de sentido para um leitor do século XXI porque, como explica Débora, num processo de identificação, buscamos ir contra as normas absurdas e arbitrárias do sistema, da mesma maneira que o seu protagonista. “Essa é a grande questão que faz com que o 1984 ressoe de maneira tão forte na nossa atualidade. Não é à toa que na eleição de Trump esse foi um dos livros que voltaram ao topo de vendas. Por isso que não adianta falar que Orwell adivinhou o futuro, que ele previu os iPads, as câmeras de celular e toda a parafernália tecnológica em que estamos imersos. Ele apenas descreveu de maneira muito crítica usando imagens tão fortes – seja em cenas de tortura, seja em um caso amoroso proibido – um mundo muito familiar a nós, justamente por ainda estarmos sob esse manto de falta de igualdade e descontrole total”.
Débora Reis Tavares defendeu a dissertação de mestrado A revolta contra o totalitarismo em 1984 de George Orwell, a formação do herói degradado (disponível aqui), sob orientação do professor Daniel Puglia, do Departamento de Letras Modernas. No doutorado, segue pesquisando outras obras do autor.