Revolta de Stonewall

A Rebelião de Stonewall é um símbolo da luta LGBTQIA+ em todo o mundo

Por
Astral Souto
Data de Publicação

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“A revolta de Stonewall foi uma rebelião em que as discriminações de gênero e sexualidade se articulavam a questões étnicas e raciais, de uma população urbana vista em parte como ‘marginal’ e ‘perigosa’”, conta Júlio Assis Simões, Professor do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH). (Arte por: Astral Souto).

Na noite do dia 28 de junho de 1969, uma batalha era travada entre jovens gays e pessoas trans, em sua maioria negras, latinas e imigrantes contra a guarda policial estadunidense. A briga marcou a consolidação da reivindicação dos direitos civis para pessoas LGBTQIA+. A rebelião aconteceu no Stonewall Inn, um bar onde havia grande circulação de pessoas gays e trans, além de shows de drag queens. As batidas policiais no bar eram constantes e exaltadas, levando por muitas vezes  funcionários e frequentadores presos.

Nessa a época, a religião e a moral conservadora era definidas em detrimento aos movimentos sociais progressistas, como o negro, contracultura e o homossexual. Pessoas que pertenciam ao movimento LGBTQIA+ eram vistas como criminosas e doentes - A homossexualidade deixou de ser considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em maio de 1990 e a transgeneridade somente em 2018 - e foram duramente reprimidas e violentadas ao longo do tempo.

Porém na revolta em Stonewall Inn houve um contra-ataque, não somente à força policial, mas, de forma simbólica, ao sistema autoritário. A ofensiva se tornou um marco histórico, colocando junho como mês da luta pelos direitos LGBTQIA+, onde acontecem as grandes paradas em todo o mundo. “A rebelião virou um marco simbólico das lutas contra as discriminações de sexualidade. Entrou para o calendário global dos movimentos LGBTi+ As Paradas do Orgulho LGBT+ são expressão disso.” Comenta Júlio Assis Simões, graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Antropologia Social e doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Confira a entrevista completa: 

Serviço de Comunicação Social: Qual foi o estopim da Revolta de Stonewall?

Júlio Assis Simões: Stonewall em 1969 era um bar de frequência predominante de jovens gays e pessoas trans pobres, negras, latinas, muitas recém-migradas para a cidade. Por causa disso, sofria constantes batidas policiais. As pessoas que o frequentavam eram ameaçadas e detidas pela polícia. Na noite de 28 de junho, uma parte dos frequentadores decidiu reagir a mais uma incursão policial que acontecia. A resistência se converteu numa batalha pela noite até a madrugada, liderada especialmente por aquelas pessoas mais pobres e discriminadas.

Serviço de Comunicação Social: No começo dos anos 70 o movimento pelos direitos dos negros e de contracultura eram influentes. Esses movimentos foram convenientes para que a manifestação de Stonewall acontecesse?

Júlio Assis Simões: Certamente houve sinergia entre os diversos movimentos de direitos civis da época. A revolta de Stonewall foi uma rebelião em que as discriminações de gênero e sexualidade se articulavam a questões étnicas e raciais, de uma população urbana vista em parte como "marginal" e "perigosa". Penso que havia uma sensibilidade mais ampla, ligada ao que se chamava de contracultura, que favorecia essas aproximações. nos EUA, a mobilização contra a guerra do Vietnã foi um catalisador importante também. Mas os relatos de época sugerem que Stonewall foi uma rebelião espontânea, que de certo modo surpreendeu os incipientes movimentos organizados pelo combate à discriminação e à violência contra homossexuais e mesmo os demais movimentos por direitos civis. Isso sugere que ainda não havia articulações políticas tão consistentes entre esses diferentes movimentos.

Serviço de Comunicação Social: Qual a importância dessa rebelião para o movimento LGBT atual?

Júlio Assis Simões: A rebelião virou um marco simbólico das lutas contra as discriminações de sexualidade. Entrou para o calendário global dos movimentos LGBTi+ As Paradas do Orgulho LGBT+ são expressão disso. No Brasil, esses efeitos vieram aos poucos, ao longo dos anos 1970, com a emergência do movimento então chamado de homossexual. Os efeitos foram mais culturais que diretamente políticos, num primeiro momento mas foram de inegável importância.

Júlio Assis Simões é Vice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência Social (Antropologia Social) da FFLCH-USP e membro do Conselho Fiscal e do Comitê de Gênero e Sexualidade da Associação Brasileira de Antropologia