Pesquisa da USP analisa a ação dos governos estaduais no Norte do país para o desenvolvimento econômico e ambiental da região amazônica
Em um contexto de crise climática, como o enfrentado atualmente, um dos locais mais visados para mitigar a questão ambiental é a Floresta Amazônica. A partir de uma dissertação de mestrado defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, foi analisado que o Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal, organização dos nove estados brasileiros da região amazônica, tem o potencial de influenciar a política externa brasileira para o clima e, consequentemente, estabelecer um conjunto de ações de combate às mudanças climáticas na região.
O que é o Consórcio da Amazônia Legal?
O Consórcio surgiu no primeiro mandato do presidente Lula (2003-2006) com o Fórum de Governadores da Amazônia Legal, criado pelo governo nacional. Entretanto, com o desenvolvimento do Fórum, “os estados foram percebendo que, ao criar um Consórcio, uma autarquia, eles poderiam ter mais força tanto no cenário nacional quanto internacional”, afirma Natália Hedlund Jardim, pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da FFLCH.
Assim, a formação do Fórum possibilitou aos estados do Norte fazerem compras conjuntas, cooperarem em política regional, terem maior acesso aos tomadores de decisão, levarem a “voz” da Amazônia para o exterior e, principalmente, conseguirem mais financiamento em âmbitos local e mundial.
Resultados
Natália analisou desde o período anterior à criação do Consórcio, em 2017, até o ano de 2023. Em sua pesquisa, chegou ao resultado que durante o governo Bolsonaro, de agosto de 2019 a outubro de 2022, houve uma discordância entre o Consórcio e a União relacionado às decisões de políticas externas. Já entre novembro de 2022 e dezembro de 2023, no decorrer do governo Lula, ocorreu uma maior aproximação entre os dois lados.
Ainda que federalmente o Consórcio tenha enfrentado entraves para seu pleno exercício, sua coligação regional foi bem estruturada e mantida durante sua atividade. Em 2021, momento de instabilidade no governo federal, o Consórcio passou a desenvolver sua autonomia no cenário internacional, com participação independente do Brasil na Conferência das Partes (COP). Quando a conjuntura política se alterou, com o mandato de Lula em 2023, o Consórcio diminuiu sua participação autônoma e passou a cooperar com o Executivo federal.
O Consórcio desempenha um papel de defensor da soberania territorial e ambiental da região amazônica.“Nesse momento, em que o governo nacional estava dissidindo sobre a questão amazônica em relação a outros países, o Consórcio acabou surgindo como uma alternativa para tratar questões da Amazônia internacionalmente” , explica a pesquisadora.
A partir da defesa de interesses ambientais e regionais por meio do Consórcio, houve a realização de avanços como a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP 30), que acontecerá em Belém em novembro, a retomada do Fundo Amazônia e o estabelecimento do mercado de carbono brasileiro.
Governos estaduais como agentes ativos na política externa
O estudo levanta a importância que os governos estaduais podem assumir na política externa, pois o Consórcio, formado por administrações regionais, relacionou-se com atores internacionais e permitiu o desenvolvimento da região amazônica de maneira autônoma.
“Eu espero que (a dissertação) sirva para colocar essa ideia, que ainda é muito incipiente de governos regionais atuando em temáticas internacionais, mais à frente. Reconhecer que os governos estaduais também têm formas de atuar internacionalmente e que eles, às vezes, conseguem ter resultados até melhores que os governos nacionais”, declara Natália.
Além disso, o Consórcio garantiu a adesão de agentes mundiais e locais nas políticas públicas e no financiamento climático da região amazônica, o que atribui à organização o potencial de influenciar a política externa brasileira para o clima e, possivelmente, ajudar na mitigação das alterações ambientais.
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A pesquisa, realizada por Natália Hedlund Jardim, foi escrita integralmente em inglês com o objetivo de alcançar mais veículos internacionais, devido à relevância temática das mudanças climáticas abordadas em sua dissertação.
A dissertação de mestrado O Papel do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal na Formulação da Política Externa Brasileira para Mitigação das Mudanças Climáticas foi defendida por Natália Hedlund Jardim em setembro de 2024 no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política e orientada pela professora Janina Onuki.
A reportagem em áudio está disponível no Spotify: