Professor do Departamento de Sociologia tem projeto aprovado por edital da Fapesp

Murillo Marschner Alves de Brito foi contemplado na nova modalidade de apoio Auxílio Projeto Inicial π (Pi) 

Por
Eliete Viana
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Editoria

Murillo Marschner Alves de Brito
O professor Murillo Marschner Alves de Brito ingressou na carreira docente na FFLCH-USP no ano de 2019 e por isso se enquadra nesta nova modalidade de apoio da Fapesp - Foto: Reprodução site Departamento de Sociologia 


No final de dezembro, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) divulgou a lista de projetos selecionados na primeira chamada de propostas da nova modalidade de apoio Auxílio Projeto Inicial π (Pi), que se destina a apoiar projetos baseados em ideias audaciosas e favorecer o estabelecimento de carreira de pesquisa e ensino de sucesso, além da orientação de estudantes de pós-graduação e de graduação.

O projeto Expansão com Equidade? Origens sociais e destinos educacionais no acesso ao ensino superior no Brasil, que tem como pesquisador responsável Murillo Marschner Alves de Brito, professor do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, foi um dos 106 selecionados para terem acesso ao instrumento de financiamento de médio prazo da Fapesp. 

Projeto

O objetivo principal do projeto é a identificação e a documentação de parâmetros de estratificação educacional no acesso ao ensino superior público, ou seja, como características socioeconômicas de candidatos estruturam as chances de diferentes trajetórias educacionais no nível superior.

"Como vivenciamos em períodos recentes um conjunto significativo e bastante diverso de iniciativas de políticas que mexeram nos mecanismos de ingresso (políticas afirmativas são um exemplo, mas tivemos também políticas de bonificação, a implementação do [Sistema de Seleção Unificada] SiSU, entre outras) nos interessa também entender se estas políticas tiveram impacto sobre a estrutura de oportunidades, ou, dizendo mais formalmente, se elas foram capazes de transformar a forma como origens sociais e destinos educacionais se associam", explica o professor responsável pelo projeto.

Segundo Marschner, a inovação em relação à literatura contemporânea, que vem documentando de forma recorrente a transformação no perfil de quem ingressa na universidade, é que o projeto pretende analisar não somente quem efetivamente ingressa na universidade, mas a relação entre o conjunto da população que tenta ingressar (ou seja, as pessoas que se inscrevem nos processos seletivos) e a população que efetivamente ingressa.

"Com este desenho, estamos desafiando as leituras que argumentam no sentido da diminuição das desigualdades no acesso em períodos recentes, pelo seguinte: sabemos que a acessibilidade da conclusão do ensino médio cresceu significativamente desde meados da década de 1990, o que em alguma medida explica a expansão significativa da educação superior no país nos últimos 25 anos. Segmentos antes excluídos da educação em nível médio passaram a atingir esse nível educacional, aumentando a população elegível à educação superior – que também cresce muito. No entanto, se a proporção da população de segmentos socioeconômicos mais baixos que conclui a educação de nível médio cresceu mais do que a proporção desta população que efetivamente ingressa na educação superior, acreditamos que colocam-se em cheque conclusões sobre a diminuição das desigualdades de acesso que esta literatura sugere. Se olhamos exclusivamente para a população que ingressa nas instituições de educação superior não é possível enxergar esse processo", destaca Marschner. 

Pelo título do projeto e como Marschner é o vice-coordenador do Programa de Acolhimento aos Estudantes Cotistas (Paeco), dá para imaginar que a pesquisa é relacionada com cotas étnico-raciais e o trabalho do Paeco. O professor explica que, em certa medida sim, mas não totalmente. Porque há sem dúvida uma proximidade temática em relação às atividades desenvolvidas no Programa, mas ele é um projeto de extensão fundamentalmente [apesar dos coordenadores terem incorporado atividades de pesquisa ao Programa] e é, portanto, independente do projeto de pesquisa que será desenvolvido.

Paeco

O Paeco foi criado em 2018 na FFLCH – tradicionalmente uma das portas da Universidade que mais recebem estudantes provenientes de escolas públicas, em especial grupos minoritários definidos pela Lei de Cotas como pretos, pardos e indígenas (PPI) – como um espaço de pesquisa, acolhimento e atividades de permanência estudantil; conjugando estudos e atividades relacionadas à inclusão social e racial nas universidades brasileiras, o Paeco está focado em promover a interlocução entre várias instâncias. A atual coordenação é da professora Márcia Regina de Lima Silva, com Murillo Marschner Alves de Brito na vice-coordenação, ambos são do Departamento de Sociologia.


"Trata-se de um projeto de pesquisa sobre estratificação educacional no acesso ao ensino superior público. Nos interessa também pensar a forma como iniciativas de políticas distintas implementadas na estruturação dos critérios de admissão podem ou não ter impactos sobre a estrutura de oportunidades. Assim, a pergunta principal de pesquisa do projeto [aprovado pela Fapesp] é: como se apresenta a relação entre origens sociais e destinos educacionais no acesso ao ensino superior público e como ela varia ao longo do tempo?", frisa.

Democracia

Ao ser perguntado sobre a importância deste projeto de pesquisa, o professor responsável aponta que "em última instância é um argumento sobre democracia".

Ele lembra que existe um consenso sobre como a educação constitui-se no principal mecanismo de alocação de pessoas em hierarquias sociais em sociedades modernas, e como a crescente centralidade da educação nestes processos se contrapõe a processos de transmissão intergeracional de posições na hierarquia social, que parametrizavam majoritariamente a estrutura social em sociedades pré-modernas. 

"Assim, o nosso argumento na construção do problema de pesquisa que orienta o projeto é o de que quanto mais democrática for uma sociedade, menor será a associação entre a origem social das pessoas e o destino educacional delas – já que o destino educacional tem um efeito enorme sobre as chances de se ocupar posições mais altas ou mais baixas na hierarquia social. Trata-se portanto de uma maneira de interpelar, empiricamente, a questão da mensuração do nível de desenvolvimento democrático da nossa sociedade e sua evolução ao longo do tempo. Será que os mecanismos que as instituições públicas mobilizam para incorporar novos e novas estudantes e as políticas recentemente implementadas neste processo de incorporação são capazes de promover democratização deste acesso – e por conseguinte fazerem avançar o nível de democratização da sociedade – ao diminuírem a associação entre origens sociais e destinos educacionais, ou não, elas não foram capazes de promover ao longo de tempo uma diminuição desta associação? A meu ver, são perguntas muito relevantes a serem respondidas, cujas respostas podem ser centrais em promover avanços em termos de democratização de chances de vida, nos ajudando, a partir de evidências empíricas, a pensar novos mecanismos de promoção de acesso que permitam democratização (ou uma maior democratização) de nossa sociedade", ressalta Marschner.

Nova modalidade de apoio

O Auxílio à Pesquisa Projeto Inicial π se destina a apoiar projetos de pesquisa baseados em ideias audaciosas que favoreçam o estabelecimento de uma carreira de pesquisa e ensino de sucesso.

Segundo a Fapesp, tais projetos devem ser desenvolvidos sob responsabilidade de pesquisadores recém-contratados com excelente potencial. E, por isso, puderam submeter propostas à chamada (o lançamento aconteceu em 9/12/2021 e o prazo para submissão de propostas foi até 20/3/2022) os pesquisadores contratados com vínculo empregatício há menos de 8 anos (depois de 2013, a partir de 2014), em instituições de pesquisa do estado de São Paulo. Além disso, o proponente tinha de possuir título de doutor, obtido há menos de 12 anos (defesa realizada depois do ano 2009, a partir de 2010) até a data limite de submissão da proposta.

O professor do Departamento de Sociologia se enquadra neste perfil por ter ingressado na carreira docente na FFLCH-USP no ano de 2019 e realizado a defesa da sua tese de doutorado em 2014, no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade, com o título A dependência na origem. Desigualdades no sistema educacional brasileiro e a estruturação social das oportunidades.

Na chamada de propostas é destacado que "com o Auxílio π, a Fapesp oferece condições diferenciadas de financiamento de médio prazo para apoiar pesquisadores a estabelecerem uma carreira sólida".

Esta nova modalidade de apoio tem duração de até 60 meses, com a possibilidade de prorrogação por até 12 meses adicionais, em condições excepcionais e com justificativa aceita pela Fapesp.

No total, entre as propostas selecionadas, 28 projetos são de Unidades de Ensino e Pesquisa da USP. A lista com todos os projetos pode ser acessada no link de divulgação da Fapesp a respeito: Chamada para projetos iniciais tem propostas selecionadas.