Nascimento de Lord Byron

Autor de obras como "Don Juan", Byron tornou-se nome de uma escola literária brasileira conhecida como “geração byroniana”, o Ultrarromantismo

Por
Alice Elias
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Nascimento de Lord Byron
Segundo Lucas Zaparolli de Agustini, "Até mesmo na China, no começo do século 20, Byron foi lido e traduzido como sinônimo não só de sedução e vida desregrada, mas de rebeldia, de revolução, de luta e libertação dos oprimidos". (Arte: Renan Braz)

 

Em 22 de janeiro de 1788, nasceu Lord Byron, o escritor mais famoso do Romantismo. Sua obra, composta por títulos como Don Juan e O Corsário, é inteiramente poética. Traduzido para línguas como o francês, chines, japonês e português, Byron tornou-se nome de uma escola literária brasileira conhecida como “geração byroniana”, o Ultrarromantismo.

Além de poeta, é considerado um herói na Grécia, uma vez que lutou pela libertação da nação, até então, oprimida, sendo homenageado com uma estátua no Jardim dos Heróis. A depender do local e da época em que foi lido e traduzido, o escritor foi considerado desde revolucionário, sedutor, jovem apaixonado até herói – inclusive, acredita-se que Byron alimentou a interpretação dúbia que tinham de si mesmo. “Além da importância de suas obras, o fato de ter sido um poeta lorde, ter dado voz aos oprimidos no Parlamento, e que se tornaria herói de outro povo (no caso dos gregos), tendo mesclado a própria vida com suas obras, fazendo da vida uma obra, esse é um feito que nenhum outro poeta alcançou”, afirma Lucas Zaparolli de Agustini, doutor e mestre em Estudos da Tradução pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Confira a entrevista completa:

Serviço de Comunicação Social: Quem foi Lord Byron?

Lucas Zaparolli de Agustini: Lord Byron foi o escritor mais famoso do Romantismo.

Durante o século 19 tornou-se uma mania: ditou moda, inclusive de vestimentas; foi pioneiro naquilo que hoje chamamos de viagens de turismo, por exemplo; mesmo antes de morrer, viu praticamente toda sua extensa obra traduzida para o francês, e do francês influenciou diversas literaturas do mundo, chegando à China e ao Japão, não sem antes ter abalado a literatura brasileira com apenas um poema, dos menos importantes no conjunto de sua obra, a qual não foi ainda totalmente traduzida à língua portuguesa.

Apesar disso, tornou-se nome de uma escola literária no Brasil, a fase do Romantismo conhecida como Ultrarromantismo, ou “geração byroniana”. Em nossa Literatura, pela escassez de traduções de suas obras satíricas da maturidade no século 19, sua fama ficou reduzida, erroneamente, ao rótulo de poeta sombrio e macabro. Porém, hoje em dia, é mais considerado por sua obra-prima, o épico satírico Don Juan.

Na Grécia, no entanto, quando se admira sua estátua no Jardim dos Heróis, Byron não é lembrado só como poeta, mas como um ser humano valente e generoso que reuniu suas forças para lutar pela libertação de uma nação oprimida, que não era nem mesmo a sua. E talvez tivesse se tornado Rei da Grécia, caso vivesse mais sete anos e não houvesse morrido ali, aos 37 anos, por conta das circunstâncias desfavoráveis da guerra.

Serviço de Comunicação Social: Quais elementos caracterizam a escrita de Byron?

Lucas Zaparolli de Agustini: Fora alguns discursos proferidos na Câmara dos Lordes, na Inglaterra, a obra de Byron é inteiramente poética.

As obras que compôs na juventude alcançaram fama até então raramente vista nos meios literários. Seu épico Childe Harold, que narra as peripécias de Harold, espécie de alter ego daquela fase da vida de Byron, tornou-o famoso da noite para o dia.

A obra O Corsário, também um poema narrativo, mas mais curto, como um conto escrito em versos, vendeu mais de dez mil exemplares no dia de lançamento, feito digno de nota mesmo atualmente.

Os poemas mais conhecidos do autor são precisamente esses poemas narrativos, contos versificados como Parisina, O Giaour, Manfred etc.

Um ou outro poema curto foi traduzido mais que outras obras, e contribuiu para aumentar sua fama, que variava bastante dependendo do local e do momento em que foi relido ou traduzido. Dessa forma, a fama do autor variava de jovem apaixonado a revolucionário, de sedutor e coisas piores a herói – e de certo modo ele próprio alimentava essa interpretação dúbia, buscando misturar vida e obra.

Atualmente, o épico satírico Don Juan, escrito na mesma forma poética de Os Lusíadas, a oitava-rima, com mais de dezesseis mil versos, o dobro de extensão da obra de Camões, e que subverte o mito de Don Juan, além de mesclar aventuras do autor com as observações do narrador da epopeia, é considerado sua obra-prima; e apenas recentemente, em 2020, ganhou a primeira tradução integral para a língua portuguesa.

Essa tradução encontra-se disponível, no momento, somente na Biblioteca Virtual de Teses da USP, na qual se pode fazer o download gratuito no link Don Juan de Lord Byron: tradução integral, comentário e notas.

Serviço de Comunicação Social: Quais foram suas principais contribuições para a Literatura? Em sua análise, como elas repercutem atualmente?

Lucas Zaparolli de Agustini: Por exemplo, ao se acessar a Netflix, há grande chance de, em algum momento, ser sugerido o filme Mary Shelley, lançado há uns cinco anos, que transforma a jovem autora de Frankenstein em feminista, como foi sua mãe, Mary Wollstonecraft. Não tardará para aparecer nesse filme o próprio Lord Byron, representado ali como dândi bissexual. Além disso, diga-se de passagem, após a morte de Shelley, Mary teve apenas Lord Byron como amigo, como afirmaria várias vezes depois.

A própria vida de Byron, aventureira e romântica, é perfeita para o cinema, tendo sido feitas dezenas de películas a seu respeito.

Se suas obras românticas, pioneiras no gênero, hoje perderam o interesse por terem sido imitadas à exaustão, por outro lado, suas obras satíricas da maturidade ainda são apreciadas por seu bom humor e crítica irreverente e descontraída. Não à toa, trechos de Don Juan foram traduzidos nesses últimos anos por nomes como Décio Pignatari e Augusto de Campos. Essa obra desperta graça e tira risos do leitor enquanto desafia sua perspicácia mesmo atualmente.

Mas além da importância de suas obras, o fato de ter sido um poeta lorde, ter dado voz aos oprimidos no Parlamento, e que se tornaria herói de outro povo, no caso dos gregos, tendo mesclado a própria vida com suas obras, fazendo da vida uma obra, esse é um feito que nenhum outro poeta alcançou, e talvez tenha sido essa sua principal contribuição para a Literatura. Até mesmo na China, no começo do século 20, Byron foi lido e traduzido como sinônimo não só de sedução e vida desregrada, mas de rebeldia, de revolução, de luta e libertação dos oprimidos.

Lucas Zaparolli de Agustini é mestre e doutor em Estudos da Tradução pela FFLCH. Realizou, dentre outras, a primeira tradução integral para o português do épico-satírico Don Juan, de Lord Byron, tradução feita em verso, anotada e comentada dos mais de dezesseis mil versos que compõem a obra.
É pesquisador especialista em Byron e byronismo, poesia do Romantismo e tradução literária em geral. Possui experiência nas áreas de tradução, poéticas comparadas e poesia, dedicando-se ainda à pesquisa do mito de Don Juan, do gênero satírico e da literatura lusófona, anglófona e de outras culturas. Para quem se interessar sobre o tema, sua dissertação de mestrado está disponível em Don Juan de Lord Byron: estudo descritivo das traduções, tradução, comentários e notas, e sua tese de doutorado em Don Juan de Lord Byron: tradução integral, comentário e notas.